A presença de José Serra no Congresso Nacional, nesta quinta-feira (24), causou irritação entre aliados do ex-governador e senador eleito Aécio Neves (PSDB-MG). Sem compromissos programados, Serra deu as caras “aparentemente em busca de espaço na mídia”, conforme noticiou o Valor Econômico. Mas o ex-governador paulista, aproveitou a visita para, mais uma vez, demarcar posição com Aécio, na luta pelo comando do partido e pela liderança da oposição ao governo Dilma Rousseff.
Por André Cintra
Depois do segundo turno das eleições, aliados dos dois lados já trocaram farpas publicamente. Enquanto Aécio propôs o fim da hegemonia paulista e a “refundação” do PSDB, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso saiu em defesa de Serra, ao negar que o PSDB seja “muito avenida Paulista” ou precise ser refundado.
A divergência da vez se dá em torno da proposta de recriação da CPMF (Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira), que garantia R$ 40 bilhões para a área da saúde. Em 2007, quando o “imposto do cheque” foi derrubado no Congresso, a oposição se dividiu: Serra liderava a ala dos governadores tucanos favoráveis à continuidade da CPMF, enquanto senadores do PSDB e do DEM a combatiam.
Três anos depois, o sucessor de Aécio no governo mineiro, Antonio Anastasia, é quem defende a volta da CPMF. Já Serra, agora sem cargos e de olho apenas na oposição, mudou de lado. Na visita ao Congresso, em rápida conversa com parlamentares tucanos, retratou-se da posição defendida em 2007 — “eu errei” — e apelou para que o PSDB marche em bloco contra a CPMF, sob o risco de “quebrar” o partido. À imprensa, Serra deu outra versão: “(Uma nova CPMF) não vai levar mais dinheiro para a saúde de jeito nenhum".
Os aecistas não engoliram a guinada oportunista. Na opinião de um dos principais deputados aliados a Aécio, Serra tenta, de forma “autoritária” e “à base de cotoveladas”, liderar a fragilizada oposição. Até a serrista Folha de S.Paulo considerou a “visita-supresa” ao Congresso como o “primeiro passo do ex-governador de São Paulo para tentar ocupar a presidência do PSDB a partir de 2011. O caminho, porém, não será tranquilo. Há forte oposição interna à ideia de lhe dar novamente o comando da sigla”.
Serra também desatou críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “A herança que se deixa para o novo governo é muito adversa — inflação para cima, produção desacelerada, taxa de câmbio supervalorizada, déficit em conta corrente, o segundo maior do mundo, ou seja, uma economia repleta de desequilíbrio e contas fiscais maquiadas. Estes são os cinco legados deixados”, afirmou. "São vários problemas saltando do armário", agregou, citando o trem-bala.
Serra poderia ter escolhido um dia melhor para atacar Lula. O IBGE acaba de divulgar que o desemprego nas seis principais regiões metropolitanas do país atingiu o menor índice registrado na série histórica — apenas 6,1% em outubro. Em um ano, o número de trabalhadores com carteira assinada cresceu 8,4%, enquanto o rendimento médio real habitual dos trabalhadores saltou 6,5%.
De acordo com o Valor Econômico, “a postura de Serra, subindo o tom das críticas a Lula, foi interpretada pelos companheiros de partido como manifestação da intenção de comandar a oposição. Os tucanos que o acompanharam no Congresso dão como certo que Serra tentará disputar a Presidência da República novamente — projeto que não encontra entusiasmo no partido”.
No Estadão, depois de telefonar para Aécio e avisar que ia “começar a bater”, o deputado aecista Nárcio Rodrigues, presidente do PSDB-MG, mandou um recado aos tucanos paulistas. “Vão ter que nos engolir”. E explicou: “Fomos extremamente respeitosos à fila, concordando que em 2006 era a vez de Geraldo Alckmin (SP) e, em 2010, de Serra. Agora (2014) é a nossa vez (de Aécio)”. A guerra interna do PSDB saiu, definitivamente, do armário.
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