Ditadura uruguaia vigiava todos os passos de Jango
Papéis mostram que empregada do ex-presidente passava informações ao governo Monitoramento mostra que a inteligência do Uruguai colaborava com o Brasil, o que lança suspeitas sobre a sua morte, diz Jair Kirschke
Papéis mostram que empregada do ex-presidente passava informações ao governo Monitoramento mostra que a inteligência do Uruguai colaborava com o Brasil, o que lança suspeitas sobre a sua morte, diz Jair Kirschke
Viagens ao exterior, reuniões políticas e atividades empresariais do ex-presidente João Goulart (1918-1976) no exílio foram sistematicamente vigiadas pela inteligência do Uruguai -a empregada doméstica de Jango era informante da ditadura uruguaia (1973-1985).É o que revelam papéis liberados pelo Uruguai, entregues ontem pelo coordenador do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Kirschke, ao Ministério Público Federal.Jango era espionado tanto pelo Ministério do Interior, ao qual está subordinada a polícia, como pela inteligência militar: sua ficha de antecedentes lista suas atividades a partir de sua chegada ao Uruguai, em 1964, após ser deposto por "conexões e infiltrações comunistas".Ao lado das atividades políticas, os negócios de Jango eram atentamente vigiados. Citando relatório de abril de 1974, a ficha diz que o brasileiro se reuniu com o presidente argentino Juan Domingo Perón e sua equipe econômica em Buenos Aires: Jango havia articulado uma operação para vender carne aos países árabes e importar petróleo para a Argentina.A ficha diz que o escritório de exportação aberto por Jango em Buenos Aires, em 1975, faria negócios sobretudo com a China comunista e seria "uma espécie de fachada para facilitar os contatos com aquela nação".No prontuário do Ministério do Interior há seis folhas sobre encontros de Jango, como os mantidos com o senador uruguaio Zelmar Michelini e o ex-presidente da Bolívia Juan José Torres -ambos mortos em 1976 em Buenos Aires em ações atribuídas à Operação Condor, aliança das ditaduras do Cone Sul para eliminar opositores.O procurador Júlio Carlos de Castro Júnior diz que os papéis contêm fortes indícios sobre a colaboração entre as ditaduras. Documentos do Ministério do Interior mencionam a empregada doméstica de Jango, Margarita Suárez, passando informações sobre viagem do ex-presidente à França em 1976."Esse monitoramento com informações tão detalhadas mostra que os serviços de inteligência do Brasil, da Argentina e do Uruguai trabalharam juntos, o que robustece a tese de que João Goulart não morreu de causas naturais", diz Kirschke. Oficialmente, Jango morreu de infarto em dezembro de 1976. Em 2008, o ex-agente da repressão uruguaia, Mario Neira Barreiro, que cumpre pena por tráfico de drogas no Brasil, disse que ele foi envenenado.