Site ligado à revista da Marginal Pinheiros
classifica como "discurso do medo" a defesa que a presidente Dilma
Rousseff fez de direitos trabalhistas como férias e décimo-terceiro;
publicação, na verdade, faz a defesa prévia de Marina Silva que, ontem,
falou em "atualizar" a CLT, seguindo conselhos do "professor Giannetti";
para a Central Única dos Trabalhadores, presidida por Vagner Freitas, a
mensagem da candidata do PSB é óbvia: "Marina fala em atualizar as
regras para ajudar na geração de empregos. O que isso significa? Quando
os empresários falam isso eles são claros: querem diminuir direitos e
ampliar lucros. Nada mais que isso", afirma; em entrevistas, o próprio
"professor Giannetti" classificava a CLT como rígida e anacrônica
Marco Damiani _ 247 – Ao se comprometer com uma
"atualização" da Consolidação das Leis do Trabalho nos moldes desenhados
pelo "professor Gianetti", com a supressão de direitos e conquistas
trabalhistas em troca de promessas de contratações mais fáceis (e
frágeis) – como 247 destacou ontem -, a candidata do
PSB, Marina Silva, despertou a imediata simpatia do grupo Abril e seu
veículo de combate, a revista Veja.
Ao mesmo tempo em que dedica a capa da edição de papel desta semana a
chamar de "mentiras e calúnias" fatos que nem mesmo a própria Marina
desmentiu, a operação online de Veja usou boa parte do dia para
divulgar que a presidente Dilma Rousseff estaria "apelando", para
usar expressão com que o e-presidente Fernando Henrique classificou ele
próprio em jantar, em São Paulo, com a alta sociedade.
- Dilma ensaia novo discurso do medo contra Marina: 'Não mexo no 13º e férias, destacou Veja.com .
Não foi Dilma, porém, quem disse a senha que, desde sempre, significa
atentar conta a CLT – e, assim, ameaçar direitos antigos e conquistas
atuais da classe trabalhadora. Ocorre que "atualizar a legislação
trabalhista", na versão de Marina em 2014, é o mesmo que "flexibilizar a
CLT", como as entidades patronais e seus economistas chamam o ato de
mudar o conjunto de garantias ao trabalho existentes no Brasil.
Com centenas de leis necessitando melhorias e modernizações mais
urgentes, é sempre pela CLT que a elite empresarial gosta de iniciar o
que chama de reformas.
O que fez a candidata à reeleição, ficou claro, não foi discurso do
medo coisa nenhuma, como se diz popularmente, mas uma promessa objetiva:
- Não mexo em 13º e férias. Ponto, parágrafo.
Dilma disse, com um verbo, que quem quiser "atualizar",
"flexibilizar" ou autorizar revisões de alguma forma neste momento na
CLT não precisa votar nela. É fácil, basta não teclar 13 na urna
eletrônica.
Para quem quer ajudar a reescrever direitos históricos, a menor, como
se promete na doutrina Gianetti, há Marina Silva para votar.
O PSDB, é de se lembrar, pelo voz de Fernando Henrique, prometeu
"acabar com a era Vargas". Não conseguiu. Para tentar de novo, numa
versão 2.0, apesar de ele próprio ainda não ter entrado no mérito do
debate, também se tem Aécio.
Um candidato a presidente que, como Marina, emita a ordem de
"atualizar" o rol de garantias trabalhistas representadas na carteira de
trabalho com carimbos e assinaturas está, na prática, assanhando o
poder econômico para jogar pesado sobre o Congresso. Sobre os
sindicatos. Sobre os locais de trabalho. Uma palavra apenas, que tem em
si um poder perturbador de largo alcance. "Atualizar".
GIANETTI, EM 2007: "EMPREGOS COM CARTEIRA NÃO DEVEM SER COMEMORADOS" -
É assim, exatamente, como pensa o "professor Gianetti". Nos tempos em
que dava aulas no Ibemec – Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais,
Eduardo Gianetti da Fonseca, hoje o assessor econômico que mais se reúne
e mais é prestigiado por Marina, batia duro na CLT. Ele é antigo
adversário da legislação trabalhista e, especialmente, dos empregos com
carteira assinada em particular:
- O aumento dos trabalhadores com carteira assinada não deve ser
comemorado, disse ele, com todas essas letras, em 2007, em entrevista ao
jornal O Estado de S. Paulo.
- É preciso uma ampla reforma no mercado de trabalho, completou ele,
deixando claro pertencer ao time que considera a CLT anacrônica e
ultrapassada. Uma verdadeira âncora para o desenvolvimento da economia
brasileira.
Por sorte, milhões de trabalhadores com carteira
assinada veem diferente - e se irritam facilmente diante de ameaças à
velha e boa CLT.
Apenas neste ano, 701 mil novos empregos com carteira assinada foram
criados, no Brasil, desde janeiro, gostem Marina e o "professor
Gianetti" ou não. É de se perguntar para essa turma, claramente, se eles
topam jogar com o Congresso, o Ministério do Trabalho e o governo a
brincadeira de "atualizar" a CLT. O risco de perder direitos é superior a
99,99%.
O presidente da CUT, Vagner Freitas, considera "extremamente preocupante" a posição manifestada por Marina.
- Estamos falando em mexer nos interesses, mas sem qualquer garantia
de melhorias e avanços, ao contrário, de um universo de 101 milhões de
brasileiros e brasileiras aptos ao trabalho, registra Freitas.
- Deste total, 94,7 milhões trabalham e 6,26 estão desempregadas. Dos
que estão trabalhando, praticamente metade são formais. Não para, de
uma hora para outra, pela cabeça de um economista, mexer na CLT como se
não fosse um detalhe.
Não se trata, como tentou dizer Veja, de "discurso do medo", mas de
uma possibilidade real de afetar a base do sistema trabalhista
brasileiro. Isso é prioridade para quem, cara-pálida?
Para proteger Marina Silva das contradições políticas que ela vai
produzindo, Veja vai precisar muito mais do que carimbar como
demonização ou marcas do tipo propostas que, de fato, na vida real,
atingem a maioria da população. Rotular a discussão séria com ironias
como "discurso do medo" é, na prática, interditar o debate – ação que
Veja vai se especializando em praticar.