Blogueiro Eduardo Guimarães detalha as ações
contra o ministro Gilmar Mendes por ter afirmado, publicamente, que os
cidadãos que fizeram doações em dinheiro aos petistas José Genoino, José
Dirceu, Delúbio Soares e João Paulo Cunha para fazerem frente às multas
que lhes foram impostas pela Ação Penal 470, seriam suspeitos de
"lavagem de dinheiro"
Blog da Cidadania -
Em 26 de março passado, o escritório de advocacia Alonso, Freire e
Chryssocheris protocolou no Supremo Tribunal Federal petição contendo
pedido de interpelação do ministro Gilmar Mendes por ter afirmado,
publicamente, que os cidadãos que fizeram doações em dinheiro aos
petistas José Genoino, José Dirceu, Delúbio Soares e João Paulo Cunha
para fazerem frente às multas que lhes foram impostas pela Ação Penal
470, vulgo julgamento do mensalão, seriam suspeitos de "lavagem de
dinheiro".
Por orientação do escritório de advocacia, este Blog, onde foi feita a
campanha para que doadores dos petistas ingressassem na Justiça contra
acusação dessa monta, deixou de publicar a petição inicial interposta no
STF a fim de só dar informações após a conclusão do primeiro passo do
que é, simplesmente, uma luta por Justiça, pois a acusação que os
interpelantes sofreram do interpelado lhes causou graves
constrangimentos morais e, em alguns casos, até danos materiais, pois
sobre eles foi levantada uma grave suspeita diante de parentes, amigos,
empregadores, sócios, clientes etc.
Diante de tal gravidade da situação, os signatários da interpelação
do ministro Gilmar Mendes somaram-se em 205 pessoas físicas com nome,
RG, CPF, profissão, endereço, telefone e procuração assinada para os
advogados ingressarem com a ação no STF.
A petição inicial foi firmada por 205 cidadãos:
- Número Único: 99580497320141000000
- Identificação da Petição: PI 14008/2014
- Processo AC 3598.
- PET 5.159.
- Relator: Ministro Luiz Fux.
Essas mais de duas centenas de pessoas não foram as primeiras a
ingressar com a ação. Logo após as declarações de Gilmar Mendes que
motivam toda a questão, o Partido dos Trabalhadores ingressou com pedido
de interpelação no STF, mas o ministro-relator sorteado, o ministro
Luiz Fux, recusou o recebimento da medida por entender que o PT não
seria a vítima das supostas declarações difamatórias do interpelado; as
vítimas seriam os doadores.
Semanas depois, uma pessoa de Minas Gerais que doou aos condenados do
julgamento do mensalão também interpelou Mendes e, mais uma vez, o
ministro Fux negou prosseguimento da ação, agora por entender que, mesmo
sendo uma das vítimas, aquela pessoa não teria o que perguntar ao seu
acusador, pois suas acusações foram inequívocas e, assim, segundo a
interpretação da lei feita por aquele relator, haveria que ingressar
diretamente com processo contra Mendes com base no artigo 144 do Código
Penal, que trata de crimes contra a honra.
Sorteado pela primeira vez para analisar a interpelação do PT, o
ministro Fux ficou com o assunto sob seu escrutínio monocrático, ou
seja, tornou-se o “dono” da ação assim como o ministro Joaquim Barbosa
tornou-se o “dono” da execução penal exclusivamente dos petistas
condenados pelo julgamento do mensalão. Foi Fux, portanto, quem também
analisou a interpelação das 205 pessoas que este Blog organizou para
interpelarem Mendes.
Parece desnecessário dizer que a sentença de Fux sobre também esse
pedido de interpelação foi a mesma dos pedidos anteriores. Confira,
abaixo, a decisão de Fux.
—–
SENTENÇA DO MINISTRO RELATOR LUIZ FUX
PEDIDO DE EXPLICAÇÕES EM JUÍZO (ART. 144 DO CÓDIGO PENAL). AUSÊNCIA
DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES PARA A INTERPELAÇÃO JUDICIAL.
INEXISTÊNCIA DE DÚVIDAS A SEREM SANADAS POR MEIO DESTE PROCESSO
CAUTELAR. PETIÇÃO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.
Decisão: Cuida-se de pedido de explicações em juízo promovido por
Airton Miguel de Grande e outros em face de Sua Excelência o Ministro do
Supremo Tribunal Federal, Gilmar Ferreira Mendes.
O pedido tem por objeto o esclarecimento de declarações realizadas à
imprensa no dia 04 de fevereiro de 2014, oportunidade em que o
Requerido, segundo os Autores, teria sugerido a prática de suposto crime
de lavagem de dinheiro pelo Partido dos Trabalhadores por meio das
milionárias doações feitas em favor de diversos réus condenados na AP
470.
Aduzem que o presente pedido de explicações visam esclarecer o exato alcance das declarações do Requerido e a quem se destinou.
Acrescentam, outrossim, que os esclarecimentos poderiam servir de
preparação para o ajuizamento de ação penal privada por crimes contra a
honra praticados pelo Requerido.
É o relatório. Passo a decidir.
A presente interpelação judicial, conforme narrado, foi proposta por
pessoas naturais que realizaram doações em favor de diversos réus
condenados na AP 470.
O requerimento solicitando explicações se afigura como medida
processual de cariz eminentemente preparatório, constituindo-se, bem por
isso, em providência de caráter cautelar destinada ao oferecimento
ulterior de ação penal principal relativa a crimes contra a honra (i.e.,
calúnia, injúria e difamação). Nela, o Requerido é instado a esclarecer
o sentido e, especialmente, as intenções, das opiniões por ele
manifestadas.
Com efeito, a formulação de interpelação judicial é, justamente,
postular a concessão de provimento cautelar de natureza penal, no
intuito de esclarecer situações em que exista dubiedade ou equivocidade.
Dito de outro modo, o oferecimento de interpelação judicial reclama
que, das referências ou opiniões manifestadas pelo Requerido, seja
possível inferir o ultraje à honra, objetiva ou subjetiva, dos
Requerentes, de sorte a configurar a calúnia, a injúria ou a difamação.
Precisamente por isso, os únicos legitimados são as pessoas naturais
atingidas concretamente pelas manifestações proferidas.
Impõe-se, destarte, verificar, inicialmente, se a pretensão veiculada
pelos Interpelantes preenche (ou não) os pressupostos legitimadores da
utilização do pedido de explicações em juízo. E, ao examinar o pedido,
amparado na mais abalizada doutrina e a jurisprudência dos Tribunais,
assento ser manifestamente incabível tal pleito. É que a interpelação
judicial somente pode ser manejada nas hipóteses em que o Interpelante
tenha dúvidas acerca do suposto conteúdo ofensivo das palavras
prolatadas pelo Interpelado. Em outras palavras, restam ausentes os
pressupostos autorizadores da interpelação judicial sempre que
inexistirem dúvidas acerca do conteúdo moralmente ofensivo das
afirmações questionadas, bem assim nos casos em que não se vislumbra,
por parte do Interpelante, incerteza a propósito dos destinatários de
tais declarações, aí não terá pertinência nem cabimento. E é exatamente o
que in casu ocorre.
Decerto, os próprios Interpelantes, na petição inicial, não possuem
quaisquer dúvidas de que o Interpelado lhe maculou a honra, sobretudo
quando afirmou categoricamente que “em 04 de fevereiro de 2014, o
interpelado (cidadão Gilmar Ferreira Mendes), após uma sessão no STF,
deu uma declaração, com evidente cunho político/opositor, sugerindo a
potencial ocorrência de crimes de lavagem de dinheiro sem o mínimo de
indício probatório para tanto”. Na sequência, e no mesmo sentido,
salientaram que “o interpelado expressou publicamente seus pensamentos,
sugerindo potencial ocorrência de crimes de ‘lavagem de dinheiro’ e
corrupção (crime antecedente), em desacordo com o basilar princípio da
presunção de inocência, carecendo de qualquer análise fática e
documental em relação à rede de solidariedade para o pagamento das
multas. Por fim, destacaram, ainda, que “a declaração do interpelado,
amplamente veiculadas por diversos meios de comunicação, sugere a
potencial ocorrência de lavagem de dinheiro na rede de solidariedade que
arrecadou dinheiro para o pagamento das multas dos condenados José
Genoíno, José Dirceu, Delúbio Soares e João Paulo Cunha. (…) Portanto, a
declaração, com evidente cunho político, caso não seja esclarecida, tem
potencial atributo para configurar o (s) crime (s) de calúnia e/ou
difamação”.
Destarte, falece a admissibilidade da presente interpelação, máxime
porque os Interpelantes não demonstram dúvidas, tal como se extrai de
sua peça vestibular, de que efetivamente ocorreram as ofensas à sua
honra e imagem. Daí por que entendo ser inadmissível a presente
interpelação judicial com pedido de explicações, na linha da remansosa
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, verbis.
EMENTA: INTERPELAÇÃO JUDICIAL. PROCEDIMENTO DE NATUREZA CAUTELAR.
MEDIDA PREPARATÓRIA DE AÇÃO PENAL REFERENTE A DELITOS CONTRA A HONRA
(CP, ART. 144). PEDIDO DE EXPLICAÇÕES AJUIZADO CONTRA A SENHORA
PRESIDENTE DA REPÚBLICA E CONTRA O SENHOR PRESIDENTE DA COMISSÃO DE
ÉTICA PÚBLICA DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LIMITADA, UNICAMENTE, À SENHORA PRESIDENTE DA
REPÚBLICA, POR DISPOR DE PRERROGATIVA DE FORO, “RATIONE MUNERIS”,
PERANTE ESTA SUPREMA CORTE, NAS INFRAÇÕES PENAIS COMUNS. EXCLUSÃO DO
SENHOR PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA DA PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA. IMPUTAÇÕES ALEGADAMENTE OFENSIVAS AO PATRIMÔNIO MORAL DO
INTERPELANTE. RECONHECIMENTO, POR ELE PRÓPRIO, DE QUE AS AFIRMAÇÕES
QUESTIONADAS OFENDERAM-LHE A DIGNIDADE E O DECORO. AUSÊNCIA, EM TAL
CONTEXTO, DE DUBIEDADE, EQUIVOCIDADE OU AMBIGUIDADE. CONSEQUENTE
INEXISTÊNCIA DE DÚVIDA QUANTO AO CONTEÚDO DE TAIS AFIRMAÇÕES.
INVIABILIDADE JURÍDICA DO AJUIZAMENTO DA INTERPELAÇÃO JUDICIAL, POR
FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. PEDIDO DE EXPLICAÇÕES A QUE SE NEGA
SEGUIMENTO.
(…)
- O pedido de explicações, admissível em qualquer das modalidades de
crimes contra a honra, constitui típica providência de ordem cautelar,
sempre facultativa (RT 602/368 – RT 627/365 – RT 752/611 – RTJ 142/816),
destinada a aparelhar ação penal principal tendente a sentença
condenatória. O interessado, ao formulá-lo, invoca, em juízo, tutela
cautelar penal, visando a que se esclareçam situações revestidas de
equivocidade, ambiguidade ou dubiedade, a fim de que se viabilize o
exercício eventual de ação penal condenatória.
(…)
- Onde não houver dúvida em torno do conteúdo alegadamente ofensivo
das afirmações questionadas ou, então, onde inexistir qualquer incerteza
a propósito dos destinatários de tais declarações, aí não terá
pertinência nem cabimento a interpelação judicial, pois ausentes, em
tais hipóteses (como sucede na espécie), os pressupostos necessários à
sua adequada utilização. Doutrina. Precedentes.
(…)
Sendo assim, e em face das razões expostas, tenho por inadmissível a
presente “interpelação judicial com pedido de explicações”, motivo pelo
qual nego-lhe seguimento nesta Suprema Corte. Arquivem-se os presentes
autos. Publique-se. Brasília, 21 de fevereiro de 2014. Ministro CELSO DE
MELLO Relator (Pet 5146 / DF – DISTRITO FEDERAL PETIÇÃO Relator(a):
Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 21/02/2014 Publicação PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-041 DIVULG 26/02/2014 PUBLIC 27/02/2014) (Grifamos):
Ex positis, nego seguimento à presente petição de interpelação
judicial, ante a ausência dos pressupostos autorizadores para a sua
propositura, nos termos do art. 21, § 1º, do Regimento Interno do
Supremo Tribunal Federal.
Publique-se. Int..
Brasília, 22 de abril de 2014.
Ministro Luiz Fux
Relator
Documento assinado digitalmente
—–
Fux negou três tentativas de interpelação de Gilmar Mendes, o
acusador dos doadores antes tão verborrágico, mas que, agora, parou de
falar. Inclusive nos autos. Foi à mídia, acusou e, quando interpelado,
fecha-se em copas. Meses se passaram, a investigação que Mendes pediu ao
Ministério Público contra os doadores não teve seu resultado divulgado,
o assunto desapareceu da mídia, mas o dano ficou aos acusados.
Todos os que ingressaram com interpelação contra Gilmar Mendes
poderiam simplesmente entrar com a ação pelos crimes previstos no artigo
144 do Código Penal, mas é claro que aí haveria um processo bem mais
demorado, sujeito à Pauta do STF que quem estabelece é outro ministro
cujas opiniões sobre o julgamento do mensalão são extremamente
semelhantes às do ministro Gilmar Mendes.
Antes de prosseguir com o processo, portanto, há que recorrer ao
Supremo contra a flagrante disposição do ministro Luiz Fux de não
permitir que o acusador dos doadores dos condenados do mensalão explique
suas antes tão fartas palavras, agora tão escassas. Assim, o escritório
de advocacia supracitado acaba de interpor “agravo regimental” contra a
decisão do relator do caso.
O agravo levará ao Plenário do Supremo a decisão sobre a aceitação ou
não da interpelação de Mendes. Segundo explicações do escritório de
advocacia, a decisão poderá ser submetida a uma das duas turmas,
compostas por cinco ministros cada, ou até mesmo a todos os ministros
conjuntamente, com exceção do interpelado, Gilmar Mendes. O advogado
prevê que em uns 60 dias o caso poderá ir a votação no STF.
Se a decisão do colegiado for a mesma de Fux, só restará ingressar
com a ação penal contra o ministro, para que prove sua acusação ou se
retrate publicamente. Essa decisão, porém, não faz sentido ser tomada
agora. Quando chegar a hora, se o Plenário do STF também recusar a
aceitação da interpelação, os autores da interpelação terão que decidir
se prosseguem com o processo. A opinião deste que escreve é a de que o
processo deve ir até o fim.