Documento da PF diz que grupo se infiltrou na pasta e pagava para que processos sumissem
Fausto Macedo, de O Estado de S.Paulo
Relatório da Polícia Federal revela como uma organização
criminosa se infiltrou em setores da Secretaria da Fazenda de São Paulo
e corrompeu servidores para se apoderar de processos fiscais de
empresas autuadas por sonegação e outras irregularidades. O documento,
de 125 páginas, narra os movimentos e o dia a dia intenso da quadrilha,
alojada inclusive na rotina do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) -
órgão composto de 16 Câmaras Julgadoras e vinculado à Coordenadoria de
Administração Tributária da Fazenda.
A investigação aponta extenso período de predomínio do esquema de
pagamento de propinas em dinheiro vivo. A PF identificou o braço da
organização no 9.º andar do Palácio Clóvis Ribeiro, sede histórica do
Fisco, à avenida Rangel Pestana, Centro.
A PF indiciou por quadrilha, corrupção passiva e subtração de
documentos três funcionárias da área administrativa da Fazenda -
Cleiresmar Machado, na pasta desde 1990 e há cerca de 11 anos na Divisão
de Apoio às Câmaras do TIT; Denise Alves dos Santos, vinculada à
Procuradoria-Geral do Estado; e Maria Rodrigues dos Anjos, dos quadros
do tribunal de impostos.
Elas tinham acesso sem obstáculos a procedimentos fiscais e aos autos
de infração e imposição de multas. A Fazenda informou que no dia 13 de
janeiro exonerou duas suspeitas, Cleiresmar e Maria Rodrigues.
A essas funcionárias cabia a missão de dar sumiço nos autos de
processos fiscais. A PF estima que pelo menos 100 processos foram
surrupiados - total ou parcialmente - , entre 2009 e final de 2012,
quando a Operação Lava Rápido foi deflagrada e prendeu três empresários -
Antonio Honorato Bérgamo, Wagner Renato de Oliveira e Antonio Carlos
Balbi. Eles já foram denunciados pela Procuradoria da República. O juiz
Márcio Ferro Catapani, da 2.ª Vara Criminal Federal, mandou soltar os
investigados, mas abriu a ação penal.
Escritório oculto. O reduto da quadrilha, segundo a
PF, era um "escritório oculto" na avenida Alcantara Machado, Mooca, onde
Oliveira dava expediente. Desde 1998 ele trabalha com importação e
restauração de carros antigos - daí o nome dado à operação da PF. Nesse
escritório os federais recolheram em novembro trechos de 12 processos
relativos a 8 empresas autuadas em R$ 50, 84 milhões. O procedimento
relativo a Alpha Galvano Químico Brasileira encabeça a lista - autuação
de infração e imposição de multa número 3.155.190-7, de 18 de outubro de
2011, no valor de R$25.170.542,57.
Em outro endereço, de Honorato Bérgamo, foi apreendido processo de autuação de uma estamparia no valor de R$ 20.062.769,15.
A PF encontrou em poder da quadrilha 19 impressos de extratos de
processos da Fazenda denominados "TIT" e 26 planilhas com resumo sobre a
situação fiscal de empresas, incluindo números de autos de infração, os
processos correspondentes, os valores das sanções, juros de mora e
andamento. Os autos subsidiam inscrições em dívida ativa.
Os investigadores destacam manuscritos a lápis encontrados com a
quadrilha. São anotações cifradas que a PF está analisando. Uma delas:
"Juiz do CARF do TIT", "20 a 70%", "180 meses - 400.000,00"". No verso
desse papel, as inscrições: "AUTO INFRAÇÃO", "DEV. SUSPENSA",
"7.000.000,00". Para a PF pode ser indício da corrupção.
Apontados como mentores da trama, Bérgamo - o Zoio Azul -, Oliveira e
Balbi foram indiciados por quadrilha, falsidade ideológica, tráfico de
influência, corrupção ativa, crime financeiro e lavagem de dinheiro.
Balbi recrutava laranjas. Bérgamo, que se identifica como fiscal de
rendas aposentado, cuidava do registro de empresas de fachada para
movimentar recursos sonegados ao Fisco.