20 janeiro 2010

O VICE DE SERRA

Por Marcos Coimbra , sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi:
Das muitas coisas aborrecidas da eleição presidencial de 2010, uma das maiores é a insistência de alguns setores políticos e de parte da mídia na tese de que Aécio vai terminar sendo candidato a vice na chapa de Serra. Ele já disse centenas de vezes que não, mas parece que há gente que não o escuta.
Na verdade, essas pessoas apenas não acreditam nas palavras do governador. Para elas, é como se Aécio estivesse apenas fazendo um jogo de cena, fingindo que já teria tomado uma decisão sobre algo que, na verdade, permaneceria em aberto e que continuaria a fazer parte de seus cálculos. Inversamente ao que afirma, a hipótese de ser vice de Serra ainda estaria viva em seus planos.
Tudo se resumiria a uma questão de oportunidade, da escolha da hora certa em que Serra formalizaria o convite e Aécio aceitaria. Nada além de encontrar o jeito de se aproximar do outro com uma abordagem irrecusável, de, como um bom sedutor, fazer a proposta à qual ele não resistiria. Depois de cortejá-lo, de dar o bote.
Faz mais de ano que o assunto vai e vem, sem que Aécio tenha feito nem sequer um movimento que sustente a tese. Ao contrário, tudo o que ele fez foi na direção oposta.
Não havia nenhuma razão para que ele considerasse previamente encerrada a discussão sobre como seu partido iria participar da sucessão de Lula. Serra sempre esteve bem nas pesquisas, mas isso nunca foi motivo para que sua candidatura tivesse que ser encarada como inexorável e única.
De um lado, por sua vantagem ser, em grande parte, explicada pelo seu maior nível de conhecimento, fruto da participação em uma disputa nacional e várias majoritárias em São Paulo. De outro, pelo próprio Serra haver desistido de concorrer na eleição passada (quando tinha números semelhantes), ao perceber que suas chances de perder eram altas.
Quando, ainda em 2008, Aécio começou a defender que o PSDB fizesse prévias entre seus filiados para escolher o nome que o representaria na eleição, ele estava genuinamente convencido de que elas eram possíveis e salutares para o partido.
Talvez levando em conta o quanto haviam sido instrumentais para que Obama se tornasse candidato frente ao favoritismo de Hillary Clinton, ele lutou durante meses para que fossem adotadas.
Não foi por manobra ou sabedoria de alguém que elas não aconteceram. Como todos os partidos brasileiros, salvo o PT, o PSDB mal sabe quantos são seus filiados, para não dizer seus endereços. Se, em anos anteriores, tivesse havido mais preocupação em manter atualizado esse cadastro, as prévias tucanas poderiam perfeitamente ter sido realizadas.
Quando se revelaram operacionalmente impossíveis, Aécio permaneceu em campo, nunca sinalizando que recuaria para uma composição em que viesse a ser o vice de Serra. Nos últimos meses de 2009, sua disposição de ser o candidato de seu partido não diminuiu um centímetro.
É claro o porquê. Para ele, a possibilidade de ser candidato a presidente é totalmente vantajosa, vencendo ou perdendo para Dilma em outubro. Na vitória, por motivos óbvios. Na derrota, pois se tornaria um nome nacional (provavelmente maior que Serra é hoje) e assumiria o posto de principal liderança de um novo PSDB pós-FHC. Isso mais que compensaria o ônus de ficar sem mandato por alguns anos.
E se fosse o vice de Serra? Caso ele perdesse (coisa que parece perfeitamente possível à luz das pesquisas atuais), Aécio teria trocado uma vaga no Senado por nada. Ou alguém acha que um candidato derrotado a vice-presidente chega a algum lugar? Na dúvida, pergunte a José Paulo Bisol, por exemplo.
Serra não seria Serra se seu vice opinasse em seu governo. Aliás, vice com autonomia costuma ser visto pelo titular como traidor, sem que, para achar isso, tenha que ser José Serra. Ou seja: Aécio continuaria tendo trocado o Senado por quase nada.
Sua visibilidade nacional não cresceria uma vírgula durante a campanha e, no governo Serra, permaneceria mínima. O compromisso de que poderia, sabe-se lá quando, ser seu candidato vale tanto quanto uma nota de três reais.
Aécio não é vice de Serra e não pretende ser. Quem o diz é ele, que acrescenta que a probabilidade de que mude de opinião é zero. É tão difícil entendê-lo?
Correio Braziliense