06 julho 2008

As armas da política
A libertação de Ingrid Betancourt e de outros seqüestrados foi saudada com alegria por pessoas, partidos e governos das mais diferentes orientações políticas. O Partido dos Trabalhadores soltou nota a respeito.
Nunca é demais lembrar: mesmo nas guerras, há leis e costumes que devem ser observados. Seqüestrar civis, não-combatentes, mantê-los presos, sem julgamento, é uma opção profundamente incorreta e politicamente negativa. Por estas e outras razões, o PT sempre condenou os seqüestros.
Esperamos que os demais seqüestrados sejam libertados rapidamente. E que este resgate contribua para uma saída negociada entre todos os envolvidos no conflito político-militar existente na Colômbia, há várias décadas.
Ainda não está claro o que de fato ocorreu na operação de resgate, sobre a qual existem várias versões, que vão da operação de inteligência militar até a violação do direito humanitário internacional.
De toda maneira, é evidente que o governo Uribe buscará capitalizar a libertação dos seqüestrados, especialmente de Ingrid Betancourt, apresentando o êxito da operação como prova do acerto da estratégia "linha dura" de combate à "narcoguerrilha".
O mesmo poderá tentar o governo norte-americano, especialmente os republicanos (note-se que o resgate ocorreu simultaneamente à visita de John Mcain à Colômbia).
Paradoxalmente, o governo Uribe retira parte de sua força da existência do conflito militar, que lhe proporciona apoio dos EUA e um clima de terror contra setores da sociedade colombiana, além do que é sabido acerca dos paramilitares.
Uribe pode insistir numa espécie de "guerra sem fim ao terrorismo", buscando de imediato um terceiro mandato presidencial. Mas também pode buscar algum tipo de negociação, evitando o espectro de Fujimori, que derrotou militarmente o Sendero Luminoso e o MRTA, mas depois teve que fugir do Peru, estando hoje sob julgamento.
Quanto às FARC: serão capazes de fazer, com agilidade, aquilo que não quiseram ou não souberam ou não conseguiram fazer quando Raul Reyes e Marulanda estavam vivos? A guerrilha libertará imediata e incondicionalmente os demais seqüestrados? Dará sinais inequívocos de que reconhece a necessidade de encerrar a luta armada e adotar outra estratégia?
Seja como for, a situação exige ampliar a solidariedade internacional, por parte dos movimentos sociais, partidos e governos progressistas e de esquerda, de toda a América Latina e do mundo, que defendemos uma solução pacífica negociada. É fundamental apoiar os esforços, na Colômbia, de forças como a CUT, a oposição liberal e o Pólo Democrático Alternativo.
A paz interessa ao povo colombiano, interessa à esquerda colombiana, interessa à maioria dos governos latino-americanos, interessa a todos os setores democráticos e progressistas do continente e do mundo. A paz criará o ambiente político que tornará possível que a Colômbia venha a ser governada por forças progressistas e de esquerda.
Embora tenha crescido a idéia de que o governo Uribe pode derrotar militarmente a guerrilha, é preciso lembrar que ainda assim não estariam superadas, nem eliminadas, as causas políticas e sociais que a originaram.
Como foi dito em outro lugar, é necessário construir uma "saída pacífica negociada para este conflito que dura décadas, com raízes sociais e políticas profundas, negociação que permita a inserção dos guerrilheiros e de seus simpatizantes na vida pública; bem como a construção de instituições democráticas profundamente renovadas, livres da contaminação do narcotráfico e do crime organizado".
É sabido que a guerra dá continuidade à política, através de outros meios. Há quem acredite no contrário disso, superestimando "los fierros". Mas a força da esquerda está no apoio popular. É preciso fazer valer as armas da política.
Valter Pomar
Secretário de relações internacionais do PT