Fleury deu a ordem final, diz ex-agente
Barreiro afirma que comprimidos foram colocados na fazenda, no carro e no hotel Jango "era desorganizado. Abria um frasco, tomava alguns, na fazenda abria outro... E colocávamos um remédio em cada frasco"
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PORTO ALEGRE
Neste trecho da entrevista, Mario Neira Barreiro conta como João Goulart teria sido envenenado.
FOLHA - Como foi decidido que Jango deveria ser morto? BARREIRO - O que levou à morte foram interpretações erradas, exageradas do que ele falava. Fleury foi quem deu a palavra final. Em uma reunião no Uruguai, disse que Jango era um conspirador e que falaria com Geisel para dar um ponto final no assunto. Depois, em outra reunião no Uruguai, disse -não para mim, mas para um major e um general- que tinha conversado com Geisel dizendo que Jango estava complicando e que ele sabia o que deveria ser feito. E ele [Geisel] disse: "Faça e não me diga mais nada sobre Goulart". A morte não foi decidida pelo governo uruguaio, mas pelo governo do Brasil, influenciado pela CIA.
FOLHA - Qual foi o papel da CIA?
BARREIRO - A CIA pagou fortunas para saber o que Jango falava e foi responsável por muita coisa, mas não quero falar sobre isso porque tenho medo.
FOLHA - Como Jango foi morto?
BARREIRO - Foi morto como resultado de uma troca proposital de medicamentos. Ele tomava Isordil, Adelfan e Nifodin, que eram para o coração. Havia um médico-legista que se chamava Carlos Milles. Ele era médico e capitão do serviço secreto. O primeiro ingrediente químico veio da CIA e foi testado com cachorros e doentes terminais. O doutor deu os remédios e eles morreram. Ele desidratava os compostos, tinha cloreto de potássio. Não posso dizer a fórmula química, porque não sei. Ele colocava dentro de um comprimido.
FOLHA - Como as cápsulas eram colocadas nos remédios de Jango?
BARREIRO - Ele era desorganizado. Abria um frasco, tomava alguns, na fazenda abria outro. Tinha sete, oito frascos abertos. E colocávamos [referência ao grupo que monitorava Jango] um remédio em cada frasco. Colocamos os comprimidos em vários lugares: no escritório na fazenda, no porta-luvas do carro e no Hotel Liberty.
FOLHA - O sr. concordava com a operação para matá-lo?
BARREIRO - Era contrário, mas era um simples serviçal. Passei a simpatizar com ele. Goulart era um homem bom. Mas se tivessem me pedido para eliminar Brizola, eu mataria: ele era um conspirador nato.