28 outubro 2007

Lula manda recado a aliados e ao PT para evitar "marola"
KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online
Pela enésima vez, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse publicamente que não deseja um terceiro mandato consecutivo em 2010. No sábado (27/10), ao comentar idéia de aliados sobre mudar a regra da Constituição para que ele concorresse, Lula declarou: "Não apóio. Não acho necessário haver uma proposta como esta. Acho que nós temos de fazer agora é que todo mundo trabalhe para o Brasil crescer mais".

Na véspera, Lula orientara seus articuladores políticos no Congresso a bombardear qualquer iniciativa para propor uma modificação constitucional que permitisse sua candidatura ao Palácio do Planalto em 2010.

Na sexta-feira, auxiliares do presidente já atuavam contra a disposição de dois deputados federais, Carlos Willian (PTC-MG) e Devanir Ribeiro (PT-SP), de apresentar propostas para permitir a re-reeleição de Lula. Aliados no Congresso foram acionados para dizer aos dois que a idéia não é de interesse do presidente. "Não quero marola. Só atrapalha os planos do governo. Cria problema fora de hora", disse o presidente, segundo relato de auxiliares.

Willian é um obscuro deputado com desejo de conquistar holofotes. Devanir, amigo de Lula desde os tempos de sindicalismo no ABC nos anos 80, foi desautorizado no início deste ano pelo próprio presidente, quando aventou apresentar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) para criar a possibilidade de o petista concorrer seguidamente a um terceiro mandato.
As articulações de Willian e Devanir, portanto, tendem a não prosperar. Lula avalia que esse tipo de iniciativa cria um ambiente de dúvida em relação à sua declarada intenção de rejeitar uma saída a la Hugo Chávez, presidente da Venezuela que mudou a Constituição para concorrer à Presidência quantas vezes desejar. E esse ambiente atrapalharia o andamento de seu atual mandato.
Em entrevista à Folha, publicada na versão impressa em 14 de outubro, o presidente foi muito incisivo ao comentar eventual movimento queremista. Segue o trecho:

FOLHA - Se o sr. chegar ao final do mandato com imagem forte não despertará uma onda queremista, o Lula 2010? Por que muita gente acha que o sr. vai tentar a re-reeleição.

LULA - Porque no Brasil tem muita gente que não quer levar a política a sério. A alternância do poder é educadora para a construção da democracia. Não existe ninguém insubstituível.

FOLHA - Está vacinado contra a tentação?

LULA - Não existe hipótese para o bem do Brasil, para o bem da democracia e para o meu bem.

Movimentos como os de Willian e Devanir obrigam Lula a negar constantemente uma intenção que realmente não tem, apesar da paranóia de muita gente na política e na imprensa. O petista tem mais de três anos de mandato pela frente. Convenhamos, é muito tempo. Mas sempre é mais fácil achar que intenções inconfessáveis movem os políticos o tempo todo.
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Nas nuvens
Já virou brincadeira no Palácio do Planalto dizer que Lula não pode se sentir o rei da cocada preta. Se acha que está muito bem, alguma coisa ruim acontece. Pois é. De acordo com ministros, o presidente nunca demonstrou tanta alegria nos quase cinco anos de poder.

Lula, que fez no sábado 62 anos, avalia que colherá resultados administrativos positivos nos próximos três anos e que terminará o mandato com alta popularidade. Essa avaliação contribuiu para que enviasse o recado de que não deseja que aliados e petistas criem "marola".

Na mesma entrevista à Folha, ele admitiu que pode se candidatar de novo à Presidência, mas apenas em 2014. Naquela conversa, respondeu também a uma pergunta específica sobre a reeleição. Não falou apenas em tese contra esse instituto. Disse que apoiava a emenda constitucional que tramita no Congresso para acabar com a reeleição.

Segue o trecho:
FOLHA - Descarta ser candidato a presidente em 2014 ou 2015 [quando terá quase 70 anos?

LULA - Não. Em política, seria infantil da minha parte dizer que vou decidir o meu destino em 2014, 2015. Tenho uma filosofia que aprendi com a minha mãe: `Rei morto, rei posto´. Lembro que Juscelino Kubitschek imaginava voltar depois e não voltou. Não posso trabalhar em momento nenhum com essa hipótese na minha cabeça porque será o meu fracasso. Essa coisa, se tiver de acontecer, a conjuntura do momento vai indicar. Até porque quero dar um exemplo de ex-presidente: quero deixar a Presidência e não vou virar palpiteiro.
FOLHA - Apóia a emenda que acaba com a reeleição?

LULA - Um mandato de quatro anos é muito pouco. O presidente toma posse em 1º de janeiro. No primeiro ano não faz nada porque o Orçamento já está comprometido. No segundo, quando começa a fazer, tem eleições municipais: seis meses antes da eleição não pode fazer convênio com nenhuma prefeitura. Então, já tem um ano e meio morto. Depois tem outro ano para governar e, no ano seguinte, tem eleição. Um mandato de quatro anos no Brasil é quase inadministrável. Vamos acabar com a reeleição e aumentar o mandato.

FOLHA - Apóia a emenda?

LULA - Apóio, apóio. Se não aumentar o mandato, é melhor ficar a reeleição. Sei que para a oposição é ruim, porque ela sempre acha um mandato mais longo difícil, uma reeleição difícil, mas é importante que um presidente tenha a possibilidade de concluir um projeto.
*
Vida real

Até por realismo político, Lula não deseja embarcar na onda da re-reeleição. Seria uma batalha de desfecho incerto e de custo político capaz de jogar fora conquistas de seus dois mandatos.
Um aliado do presidente diz que o custo político de aprovar a prorrogação da CPMF no Congresso já é tremendo. "Imagine uma articulação para que Lula possa concorrer em 2010. Teria de entregar a Petrobras, a Fazenda e o Palácio da Alvorada."