POR VERA MARQUES*
Circula no território livre da internet uma mensagem que dá conta de uma grande armação envolvendo a história do “bengalador de deputado”, aquele velhinho que atacou José Dirceu, ás vésperas de seu julgamento político pela Câmara.
Segundo o relato que corre na rede, o senhor Yves Hublet seria um ator, o qual tendo atuado nos filmes "O Paraíso das Solteironas" (com Mazzaropi) e em "Independência ou Morte" (com Tarcísio Meira), ganhava a vida ultimamente como Papai Noel do shopping Muller, em Curitiba, onde fora “descoberto” e contratado pela oposição para acertar Dirceu em cheio, bem às vésperas de sua degola.
A mensagem dá inclusive o endereço de um site, o qual não tive a menor paciência de checar, mas deixo aqui, para os detetives do mundo virtual se divertirem à vontade. Fica em:
http://www.museumazzaropi.com.br/filmes/21parai.htm).
Lá, ainda segundo a mensagem, pode-se comprovar a participação de Yves no filme do mais antigo e querido caipira famoso do país.
Isso não quer dizer muita coisa, pois não se pode dar muito crédito ao que circula na rede.
A capacidade de produção criativa dos internautas é surpreendente.
Pode ser tudo uma grande balela.
Como também pode ser uma meia verdade, já que nada impede o tal senhor Yves de ser um ator e ao mesmo tempo um cidadão indignado, querendo fazer justiça com o próprio símbolo fálico.
É claro que soa um pouco estranho que, aos sessenta e sete anos, idade que lhe é atribuída pelos jornais, só agora o senhor Yves tenha tido esse desejo incontido de agredir fisicamente um parlamentar cujo nome surge associado a corrupção e irregularidades. Onde andava ele quando estouraram casos como o dos “anões do orçamento” ,o da violação do painel de votação do Congresso ou o da suposta compra de votos para a reeleição de FHC? Por que perdeu tantas oportunidades?
De qualquer forma, ainda que tardiamente, parece que o senhor Yves estava mesmo muito indignado, já que, para dar vazão a seu ódio, viajou de Curitiba até Brasília, mesmo sendo portador de algum tipo de deficiência ou doença debilitante. Sim, pois, a maioria das pessoas de sessenta e sete anos não costuma usar bengala.
Tendo percorrido toda essa milhagem e enfrentado longas horas de vôo ou estrada, o “Vingador de Bengala” teve todo o cuidado de esperar que Dirceu estivesse ao seu alcance e cercado de fotógrafos, que rapidamente registrariam o feito, para desferir-lhe a sentença cidadã.
Como ele entrou lá, como conseguiu chegar tão perto do Deputado, justo naquele momento crucial, véspera de seu julgamento, ninguém sabe, ninguém viu. Só se sabe que ele logrou êxito e a bengalada rendeu frutos para a oposição.
O deputado Chico Alencar, um PeTista arrependido do Rio de Janeiro, que hoje engrossa a bancada do P-Sol , declarou à imprensa ter votado a favor da cassação de seu ex-companheiro Dirceu “pra não levar bengaladas na rua”. Mesmo reconhecendo, na mesma fala, a importância histórica do homem que ajudou a defenestrar.
É realmente muito forte o conteúdo simbólico de uma bengala, seja por sua conotação fálica, seja pela associação à figura de pai ou avô, sempre imagens complexas e perturbadoras no inconsciente coletivo.
Se assim não fosse, por que estaria o nobre deputado tão temeroso de bengaladas? Afinal, ele não teve medo algum de trocar de partido em meio a um mandato obtido sob a legenda do PT e apanhar da militância de seu antigo partido que, certamente, tem gente bem mais jovem e forte que o velhinho bengalador.
Nem parece temer a cobrança e a censura de muitos de seus alunos e colegas da Faculdade de Educação da UFRJ, donde está licenciado há anos, para dedicar-se à política, se para lá tiver de voltar em futuro breve, caso o balão do P-Sol não decole para uma nova legislatura. Afinal, como um professor de História pode dizer aos jornais que ignorou a história política de um ex-companheiro, na hora de decidir seu destino? Como vai explicar isso às suas futuras turmas? Eu não teria coragem.
Mas, o valente Chico só teme mesmo a bengala. Freud deve explicar.
Agora, os jornais nos dão conta de que o PFL usará uma bengala como símbolo de campanha nas próximas eleições. Algo que remete à famigerada vassourinha de Jânio Quadros, o que - cá pra nós- não deve ser portador de bons augúrio em termos eleitorais. Além de, como ícone de um partido extremamente conservador, composto em sua maioria por senhores abastados e idosos, pode até provocar o efeito contrário, fazendo com que a população – já então esquecida do episódio envolvendo Dirceu e Yves- passe associar o PFL com senilidade, pouca mobilidade, decadência, fraco equilíbrio e outras coisas às quais uma bengala pode remeter.
Se juntarmos tudo isso, podemos até achar alguma possibilidade de verdade na tal “armação bengaleiro” divulgada na rede. Mas, ao considerar essa hipótese vou ter de concordar com o Presidente quando este diz que quem mais lhe faz oposição são as chamadas “elites”.
Quem, do povo ou minimamente conhecedor dele, contrataria um ator para fazer o papel de velhinho indignado que agride o deputado “malvadão” a golpes de bengala e lhe passaria como texto: “Fristão!Fristão!” ?
Um velhinho indignado que viaja quilômetros em busca de vingança, que sabe a hora certa de campanar e atacar sua vítima, que leu Cervantes e pronuncia o nome do Mago Friston, personagem inimigo de Quixote, em corretissíma tradução lusitana, que faz toda essa associação político-literária e que ainda lembra disso na hora de baixar o cacete em um desafeto, sinceramente, só pode ser elite ou criação dela.
Eu não daria bengaladas em José Dirceu. Acho que não agrediria nenhum parlamentar, pois tenho profundo respeito pelas instituições democráticas do meu país. Acho mesmo que não agrediria ninguém fisicamente, muito menos usando um objeto, pois isso não é da minha índole e não combina com a educação de classe média que recebi.
Mas, se a minha indignação chegasse ao auge, como muitas vezes esteve perto ao ver antigas raposas e lobos seculares posando de puros cordeiros, diante dos pecados cometidos pelo PT, e eu então resolvesse sair por aí descendo a sombrinha no quengo de certos parlamentares, com certeza minhas origens popularescas, oriundas de avós pobres e imigrantes não me fariam gritar o nome de nenhum personagem literário. Eu ia bater era gritando: “seu filho dessa !” , “seu filho daquela!”
Penso que a maioria das pessoas comuns faria isso. Ou você aí, leitor, conhece alguém que sai no braço com um desafeto aos berros de: “Arsene Lupin!” “Mefisto!” “Iago!”
Na internet circula mesmo muita besteira, muita lenda, muita maluquice.
Achar que tudo isso é uma armação da oposição, que criou o absurdo personagem do “Velhinho- Bengalador-Erudito-e-Justiceiro” é assumir que ela não entende nada de povo e só conseguirá mesmo retomar o poder na base do golpe. De bengala.
*publicitária e professora universitária.
Segundo o relato que corre na rede, o senhor Yves Hublet seria um ator, o qual tendo atuado nos filmes "O Paraíso das Solteironas" (com Mazzaropi) e em "Independência ou Morte" (com Tarcísio Meira), ganhava a vida ultimamente como Papai Noel do shopping Muller, em Curitiba, onde fora “descoberto” e contratado pela oposição para acertar Dirceu em cheio, bem às vésperas de sua degola.
A mensagem dá inclusive o endereço de um site, o qual não tive a menor paciência de checar, mas deixo aqui, para os detetives do mundo virtual se divertirem à vontade. Fica em:
http://www.museumazzaropi.com.br/filmes/21parai.htm).
Lá, ainda segundo a mensagem, pode-se comprovar a participação de Yves no filme do mais antigo e querido caipira famoso do país.
Isso não quer dizer muita coisa, pois não se pode dar muito crédito ao que circula na rede.
A capacidade de produção criativa dos internautas é surpreendente.
Pode ser tudo uma grande balela.
Como também pode ser uma meia verdade, já que nada impede o tal senhor Yves de ser um ator e ao mesmo tempo um cidadão indignado, querendo fazer justiça com o próprio símbolo fálico.
É claro que soa um pouco estranho que, aos sessenta e sete anos, idade que lhe é atribuída pelos jornais, só agora o senhor Yves tenha tido esse desejo incontido de agredir fisicamente um parlamentar cujo nome surge associado a corrupção e irregularidades. Onde andava ele quando estouraram casos como o dos “anões do orçamento” ,o da violação do painel de votação do Congresso ou o da suposta compra de votos para a reeleição de FHC? Por que perdeu tantas oportunidades?
De qualquer forma, ainda que tardiamente, parece que o senhor Yves estava mesmo muito indignado, já que, para dar vazão a seu ódio, viajou de Curitiba até Brasília, mesmo sendo portador de algum tipo de deficiência ou doença debilitante. Sim, pois, a maioria das pessoas de sessenta e sete anos não costuma usar bengala.
Tendo percorrido toda essa milhagem e enfrentado longas horas de vôo ou estrada, o “Vingador de Bengala” teve todo o cuidado de esperar que Dirceu estivesse ao seu alcance e cercado de fotógrafos, que rapidamente registrariam o feito, para desferir-lhe a sentença cidadã.
Como ele entrou lá, como conseguiu chegar tão perto do Deputado, justo naquele momento crucial, véspera de seu julgamento, ninguém sabe, ninguém viu. Só se sabe que ele logrou êxito e a bengalada rendeu frutos para a oposição.
O deputado Chico Alencar, um PeTista arrependido do Rio de Janeiro, que hoje engrossa a bancada do P-Sol , declarou à imprensa ter votado a favor da cassação de seu ex-companheiro Dirceu “pra não levar bengaladas na rua”. Mesmo reconhecendo, na mesma fala, a importância histórica do homem que ajudou a defenestrar.
É realmente muito forte o conteúdo simbólico de uma bengala, seja por sua conotação fálica, seja pela associação à figura de pai ou avô, sempre imagens complexas e perturbadoras no inconsciente coletivo.
Se assim não fosse, por que estaria o nobre deputado tão temeroso de bengaladas? Afinal, ele não teve medo algum de trocar de partido em meio a um mandato obtido sob a legenda do PT e apanhar da militância de seu antigo partido que, certamente, tem gente bem mais jovem e forte que o velhinho bengalador.
Nem parece temer a cobrança e a censura de muitos de seus alunos e colegas da Faculdade de Educação da UFRJ, donde está licenciado há anos, para dedicar-se à política, se para lá tiver de voltar em futuro breve, caso o balão do P-Sol não decole para uma nova legislatura. Afinal, como um professor de História pode dizer aos jornais que ignorou a história política de um ex-companheiro, na hora de decidir seu destino? Como vai explicar isso às suas futuras turmas? Eu não teria coragem.
Mas, o valente Chico só teme mesmo a bengala. Freud deve explicar.
Agora, os jornais nos dão conta de que o PFL usará uma bengala como símbolo de campanha nas próximas eleições. Algo que remete à famigerada vassourinha de Jânio Quadros, o que - cá pra nós- não deve ser portador de bons augúrio em termos eleitorais. Além de, como ícone de um partido extremamente conservador, composto em sua maioria por senhores abastados e idosos, pode até provocar o efeito contrário, fazendo com que a população – já então esquecida do episódio envolvendo Dirceu e Yves- passe associar o PFL com senilidade, pouca mobilidade, decadência, fraco equilíbrio e outras coisas às quais uma bengala pode remeter.
Se juntarmos tudo isso, podemos até achar alguma possibilidade de verdade na tal “armação bengaleiro” divulgada na rede. Mas, ao considerar essa hipótese vou ter de concordar com o Presidente quando este diz que quem mais lhe faz oposição são as chamadas “elites”.
Quem, do povo ou minimamente conhecedor dele, contrataria um ator para fazer o papel de velhinho indignado que agride o deputado “malvadão” a golpes de bengala e lhe passaria como texto: “Fristão!Fristão!” ?
Um velhinho indignado que viaja quilômetros em busca de vingança, que sabe a hora certa de campanar e atacar sua vítima, que leu Cervantes e pronuncia o nome do Mago Friston, personagem inimigo de Quixote, em corretissíma tradução lusitana, que faz toda essa associação político-literária e que ainda lembra disso na hora de baixar o cacete em um desafeto, sinceramente, só pode ser elite ou criação dela.
Eu não daria bengaladas em José Dirceu. Acho que não agrediria nenhum parlamentar, pois tenho profundo respeito pelas instituições democráticas do meu país. Acho mesmo que não agrediria ninguém fisicamente, muito menos usando um objeto, pois isso não é da minha índole e não combina com a educação de classe média que recebi.
Mas, se a minha indignação chegasse ao auge, como muitas vezes esteve perto ao ver antigas raposas e lobos seculares posando de puros cordeiros, diante dos pecados cometidos pelo PT, e eu então resolvesse sair por aí descendo a sombrinha no quengo de certos parlamentares, com certeza minhas origens popularescas, oriundas de avós pobres e imigrantes não me fariam gritar o nome de nenhum personagem literário. Eu ia bater era gritando: “seu filho dessa !” , “seu filho daquela!”
Penso que a maioria das pessoas comuns faria isso. Ou você aí, leitor, conhece alguém que sai no braço com um desafeto aos berros de: “Arsene Lupin!” “Mefisto!” “Iago!”
Na internet circula mesmo muita besteira, muita lenda, muita maluquice.
Achar que tudo isso é uma armação da oposição, que criou o absurdo personagem do “Velhinho- Bengalador-Erudito-e-Justiceiro” é assumir que ela não entende nada de povo e só conseguirá mesmo retomar o poder na base do golpe. De bengala.
*publicitária e professora universitária.