06 setembro 2005



Relatório de Serraglio é torpe rendição à chicana golpista
Para abafar crimes do PSDB-PFL contra o povo, golpistas querem acabar investigações em pizza crucificando inocentes sem provas.



Aúltima moda entre os golpistas, expressa em editoriais de sua mídia, é que para cassar mandatos de parlamentares não há necessidade de provas das acusações, pois “o julgamento é político”. É evidente que o julgamento é político. Por isso mesmo é que são preciso provas de que os parlamentares - e outras figuras, inclusive o presidente - cometeram algum delito político, e de que esse delito político é grave o suficiente para que mereçam a pena máxima.

EMBUSTE
Toda essa conversa embusteira, que confunde julgamento político com perseguição política, transformou-se em berros - pois levar no berro é a sua única tática - depois do parecer do relator do Conselho de Ética sobre o bufão da canalha, Roberto Jefferson. Pois o relator, aliás, um deputado do PFL, registrou a inexistência de provas sobre o suposto “mensalão”, isto é, sobre a suposta compra de votos no Congresso. E, realmente, não apareceram, após mais de dois meses de investigações, CPIs e o escambau, provas dessa compra de votos. Apareceram - a rigor, reapareceram - as provas da compra de votos no governo Fernando Henrique. Do governo Lula, nada.
No entanto, em seguida, outro relator, o da CPI dos Correios, deputado Serraglio, acossado aberta e despudoradamente pela mídia golpista, lançou um “relatório parcial”. Para que um “relatório parcial”? Se as investigações estão longe do fim, que utilidade tem um relatório “parcial” agora? Somente uma: coonestar as chicanas, o que é a mesma coisa que tentar abafar no afogadilho as investigações. E foi esse o conteúdo do “relatório parcial” de Serraglio.
O “relatório parcial” excluiu o senador Eduardo Azeredo, presidente nacional do PSDB, que, como candidato a governador de Minas, recebeu quase R$ 10 milhões do esquema de Marcos Valério. Nenhum dos citados por Serraglio esteve nem perto de tal quantia.
Azeredo, ressalte-se, confessou o caixa 2, embora tenha dito que não sabia dele - apesar de indícios e testemunhos apontarem que ele sabia. Então, por que Azeredo foi excluído do relatório? Segundo Serraglio, o caso de Azeredo é diferente. Supõe-se que ele queira dizer que o dinheiro que a campanha de Azeredo recebeu era caixa 2, e não para comprar o seu voto. Mas, se esse é o caso, por que incluiu o deputado Roberto Brant, dirigente nacional do PFL, que recebeu dinheiro via Valério em sua campanha à Prefeitura de Belo Horizonte? Ninguém até hoje acusou o deputado Brant de vender seu voto ao governo ou ao PT, pela simples razão de que ele sempre esteve com a oposição. É evidente que o dinheiro recebido por Brant não era para comprar o seu voto, e sim caixa 2 de campanha. Então, por que Brant foi incluído no relatório, e Azeredo foi excluído?
No caso do deputado José Dirceu, nem mesmo houve recebimento de qualquer dinheiro de Valério ou outra qualquer irregularidade. Nem ficou provado que ele sabia do caixa 2 que o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, organizou depois que Dirceu saiu da presidência do PT. Delúbio afirmou categoricamente que nunca falou a Dirceu do assunto. Por que, então, Serraglio dedica sete páginas ao deputado, nas quais meramente transcreve o que Jefferson falou, além de dois disse-me-disse assumidos, um de Valério e outro da mulher deste? Onde está a prova de que Jefferson disse a verdade? Todos os indícios são no sentido oposto, e exatamente por essa razão o Conselho de Ética recomendou sua cassação por unanimidade. E desde quando um disse-me-disse (ou dois, ou cem) constitui algo mais do que um disse-me-disse?
Quanto aos demais deputados, Serraglio expôs um estranho princípio, ou, melhor, uma peculiar falta de princípios: segundo ele, os acusados não provaram que o dinheiro que receberam, via Marcos Valério, foi para pagar dívidas de campanha. Assim, eles devem ser culpados de ter vendido o seu voto...
Trata-se de uma inversão completa, daquelas que são inevitáveis a alguém que se dobra a chicaneiros, difamadores e golpistas. Aos infelizes que preferem essa bizarra ginástica, ao invés de manter a espinha erecta, realmente só resta chamar o avesso de direito. Jefferson inventou a história do “mensalão” porque seu esquema foi pego em flagrante. Não provou que esse “mensalão” - ou seja, a compra de votos - existiu, nem apareceu nenhuma prova disso. Mas são os outros - os difamados, os acusados - que têm de provar que não venderam o seu voto...
E, no entanto, tudo conduz à conclusão de que o dinheiro recebido por esses deputados foi mesmo para pagar dívidas de campanha. Que lógica tem o PT pagar a seus próprios deputados para que votassem a favor do governo, isto é, do governo do PT? E, note-se bem, trata-se aqui de deputados que sempre estiveram entre os mais fiéis ao governo. Por exemplo: em todas as votações o deputado Professor Luizinho votou sempre a favor das propostas do governo, e defendeu-as, fizesse chuva ou fizesse sol. É ridículo achar que ele recebeu R$ 20 mil para votar a favor do governo. É tão inverossímil que nem os golpistas ousam falar uma imbecilidade dessas. A mesma coisa pode ser dita do deputado Paulo Rocha e de cada um dos deputados petistas. E o deputado João Paulo, que, por sinal, como lembrou, nem votava, pois era presidente da Câmara? Todo mundo sabe da fidelidade de João Paulo ao PT e ao governo - por isso mesmo é que o PT e o governo o apoiaram para presidente da Câmara. Quem acha que ele recebeu R$ 50 mil em troca do seu voto, ou em troca de apoiar o governo? Ninguém, absolutamente ninguém.
A existência de seis deputados do PT entre aqueles que receberam o dinheiro, é um indício clamoroso de que esse dinheiro não foi para comprar votos. Além disso, para comprar votos em que votações? Pois nem os golpistas sustentam mais a história de Jefferson de que haveria uma mesada, etc., etc. Agora, eles dizem que não importa se era mensal ou não, exatamente porque ficou provado que não havia pagamento mensal. Mas, se não era mensal, então, para que votações esse dinheiro foi pago? Porque, das duas, uma: ou o PT pagava uma mesada que servia para comprar o voto em qualquer votação, ou não pagava mesada, e, portanto, comprava votos para determinadas votações. Como já ficou provado que não havia mesada, é preciso responder: que votações foram compradas? Mas ninguém nem ao menos tentou responder a isso. Ao contrário, foge-se dessa pergunta com as evasivas mais cínicas.

BREQUE
O “relatório parcial” de Serraglio surge exatamente no momento em que os golpistas mudaram o disco: dizem agora que o país, o povo, está cansado de CPIs, que é preciso terminar logo, cassar os parlamentares rapidamente, em suma, dar um breque nas investigações, acabar logo com esse negócio de ficar apurando. Dizem isso precisamente no momento em que as investigações batem e entram pela porta deles.
O que realmente essas CPIs trouxeram de novo, até agora? Primeiro, que Valério era operador do PSDB-PFL, que armou o esquema de caixa 2 do próprio presidente do PSDB. Segundo, que seu principal financiador era Daniel Dantas, do Opportunity, um escroque que açambarcou quase metade das telecomunicações do país, sob os auspícios de Fernando Henrique et caterva - o mesmo Dantas que tem uma bancada no Congresso chefiada pelo próprio presidente do PFL, senador Bornhausen. Terceiro, que o notório Ricardo Sérgio, caixa de Fernando Henrique e operador das propinas tucanas, andou, no mínimo, cruzando o caminho de Valério e, talvez, mais do que isso, seja o verdadeiro proprietário de uma das arapucas receptadoras de dinheiro do esquema.
Há mais, que nos dispensamos aqui de resumir. Há inclusive o aparecimento do caixa 2 de Serra na campanha para presidente, e o reaparecimento do caixa 2 de Fernando Henrique, também na eleição para presidente. Mas tudo isso sempre apontando para o mesmo lado: para os golpistas, para o tucano-pefelismo, para o assalto ao patrimônio público, para as privatizações de Fernando Henrique.
É exatamente neste momento, em que o dinheiro aponta para os crimes dos próprios golpistas, que apareceu essa onda de acabar logo com isso, de decapitar cabeças sem provas, de fazer como os nazistas faziam - perseguir, cassar, executar os adversários. E que se danem as CPIs e as investigações, aquelas mesmas pelas quais esses mesmos elementos gritavam e às quais incensavam há coisa de poucas semanas.
ABAFADOR
Serraglio se prestou a esse papel. O de abafador das investigações, de coonestador das chicanas, contra os indícios, as provas e a lógica mais elementar. Naturalmente, ainda tem tempo de se recuperar desse mau passo, e esperemos que o faça.
Mas seja como for, essa canalha golpista não vai levar no berro. E não vai porque o povo existe, fato de que aqueles que se dobrarem aos golpistas muito rapidamente se darão conta.
CARLOS LOPES
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