22 agosto 2005

MINISTRO PALOCCI , A ENTREVISTA




























21/08/2005 - Palocci rebate denúncia e nega risco à economia
Numa entrevista coletiva de 2 horas e 11 minutos, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, negou “categoricamente” neste domingo (21) as denúncias de Rogério Buratti contra ele; criticou a maneira como o Ministério Público paulista divulgou as informações; rebateu ilações publicadas na imprensa e garantiu que os fundamentos da economia brasileira estão sólidos o suficiente para resistir a crises políticas, independentemente de quem esteja à frente das instituições.

“Trabalhamos para posicionar a economia em condições de suportar qualquer turbulência. Os fundamentos são sólidos”, afirmou Palocci, citando os avanços na geração de empregos, investimentos e nas contas externas. “Essa política econômica é garantida por Lula desde antes de sua posse, com a carta ao povo brasileiro. O compromisso foi mantido depois, quando ele assumiu o governo, e é mantido a cada dia, nos pronunciamentos que faz”, lembrou.

O ministro revelou que, num telefonema, deixou o presidente “à vontade” para afastá-lo do ministério, temporária o definitivamente, em razão das denúncias de Buratti, que o acusou de comandar um esquema de pagamento de propina em seu segundo mandato como prefeito de Ribeirão Preto, entre 2001 e 2002. De acordo com Palocci, Lula recusou-se a afastá-lo.

“Telefonei para Lula para deixá-lo absolutamente tranqüilo sobre minha posição no ministério. Não vejo nenhum risco para a economia brasileira. A estabilidade não é mantida apenas pelo ministro da Fazenda. Não tenho apego a cargos”, contou.

Palocci esclareceu que, com a atitude, quis apenas deixar o presidente em total liberdade de decisão, diante dos comentários de que sua saída desestabilizaria a economia.

“Não vou utilizar a sensibilidade da economia para defender posições próprias. A economia não reagirá a qualquer evento que envolva pessoas. Estou muito seguro de que essa crise não colocará os pilares da economia brasileira sob risco”.

Denúncias de Buratti
O ministro falou sobre seu relacionamento com Buratti e sobre a veracidade das acusações que fez. As negou “categoricamente e com veemência”, como já havia feito em nota oficial. “Não recebi e não autorizei desvio de recursos para o Diretório Nacional do PT ou outras instâncias partidárias. Quero dar esta resposta cabal”.

Palocci afirmou que tal negativa se dava em todos os aspectos, ou seja, não só quanto a sua participação no suposto esquema, mas quanto à própria existência do esquema. “Nego em todos os aspectos. Isso não ocorreria durante dois anos sem o meu conhecimento”.

Buratti foi secretário de governo da Prefeitura de Ribeirão Preto na primeira gestão de Palocci como prefeito (1993-1996). Afastou-se no segundo ano, devido a denúncias de corrupção. “Ele era meu amigo, mas depois disso nos distanciamos. Tive apenas relacionamento de cunho social com a família e a pessoa dele. Não sou inimigo do Buratti, mas deixei de ser amigo pelo que aconteceu em Ribeirão”, relatou o ministro.

Escutas telefônicas e agenda
Palocci negou que Rogério Buratti fizesse lobby no ministério através de assessores, segundo matérias publicadas nas imprensa. Ele criticou especificamente uma reportagem de Veja, de que teria mandado montar um esquema de escuta telefônica no ministério.

O ministro disse que a revista ignorou as informações prestadas ao repórter antes da publicação da matéria, na edição deste fim de semana. “Acho que vocês (da imprensa) estão sendo municiados com informações caluniosas e fraudadas”, ponderou.

Depois, completou. “Isso é um grande absurdo, uma coisa desprovida de propósito. Este ministério não se presta a esse tipo de coisa. O único aparelho de escuta que eu tenho na minha casa é o estetoscópio”, disse, numa referência a sua profissão de origem, a medicina.

Sobre os contratos da prefeitura de Ribeirão com a Leão & Leão, afirmou que é uma grande empresa na região e presta serviços a vários municípios locais. Mas frisou que, no caso de Ribeirão, a licitação foi feita antes do seu governo, não procedendo, portanto, a informação de que a empresa teria ganho o contrato numa espécie de troca de favores. “Este é um dado relevante que ninguém levantou. É um dado efetivo da realidade”.

Segundo as informações de Buratti ao Ministério Público, a Leão & Leão pagava propina mensal de R$ 50 mil à prefeitura em retribuição ao contrato. Palocci rebateu. Afirmou quem, na administração dele, foi feito apenas um contrato com a empresa, no valor de R$ 140 mil. “Foi uma contratação emergencial, após um temporal, para retirar galhos e entulho das ruas. Estão misturando contratos completamente diferentes para dizer que eu tinha favorecido a empresa”.

Sobre os supostos agendamentos feitos por Buratti, intermediando encontros entre empresários e assessores do ministério e o próprio ministro, Palocci frisou que as gravações telefônicas usadas para tal ilação não provam nada de efetivo.

Foram divulgadas quatro gravações. Em nenhuma, lembrou Palocci, há marcação de encontros ou identificação de nomes. “Faço agenda com muitos empresários do Brasil. Mas sempre trato de política econômica. Se pessoas ligam e pedem agenda, não posso ser responsabilizado por isso. Estes encontros citados (nas escutas) não ocorreram”.

Investigação e MP
Palocci disse que Rogério Buratti foi colocado numa situação constrangedora antes de fazer as denúncias. Não achei correto o procedimento do promotor. Ele se apressou em divulgar, em traduzir o depoimento. Em condições de completo constrangimento, se oferece o dispositivo da delação premiada. São procedimentos que contrariam a legislação. Existiu indiscrição de autoridades. Autoridades que saem no meio do depoimento para dar entrevista estão sendo legalmente indiscretas. Quando distribuem a fita do depoimento, estão ferindo a lei”, criticou.

Ele adiantou que estuda medidas judiciais contra Buratti e o próprio Ministério Público. E avisou que escreverá uma carta ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, pedindo que analise com “seriedade” a questão do MP.

O ministro também afirmou, que independentemente do procedimento condenável, está “totalmente à disposição” para esclarecer os fatos. “O MP e a CPI terão toda a minha colaboração de forma absolutamente transparente. Se qualquer membro do MP quiser acesso aos meus dados, não precisa nem pedir à Justiça. Abro qualquer dado meu aos procuradores, só não vou distribuir de público, não vou fazer panfletagem da minha vida privada”, disse.

Palocci garantiu estar tranqüilo quando às acusações. “Não temo o porvir nem o que está colocado sobre a mesa. Eu sei do que eu fiz e do que não fiz. Foram oito meses de escuta. Há um ano estas fitas estão circulando. Não há provas contra mim”, comentou, referindo-se ao período em que a polícia grava as conversas telefônicas de Buratti.

Ele também disse não temer possíveis prejuízos à sua imagem pessoal. “Continuarei tratando todas as questões com compromisso e bom-humor. Só assim a gente consegue vencer desafios tão grandes”.

Economia
Questionado pelos jornalistas, Palocci se manifestou várias vezes sobre a solidez dos dados econômicos, elogiando a disposição do presidente Lula em manter os fundamentos que têm norteado o governo até agora.

“Não conheço nenhum movimento que fale em guinada da política econômica”, garantiu. Na seqüência, fez um balanço do esforço para chegar à situação atual.

“Assumimos nas piores condições possíveis. A inflação sem controle, a dívida pública no topo, a carga tributária elevada. 2003 foi um ano em que pouco pôde ser feito em termos de produção de boas notícias. Era preciso um forte ajuste. Entre 2002 e 2003, o Brasil poderia quebrar a qualquer momento. Hoje, não. Basicamente por dois motivos: as contas externas estão muito sólidas e a democracia avançou”.

Sobre os desdobramentos da crise, afirmou: “Estes episódios não vão abalar nossa convicção nos procedimentos, que são firmes, são duros, são medidas necessárias de estabilidade, equilíbrio e crescimento de longo prazo”.

Já a reação negativa do mercado financeiro na última sexta-feira (19) - com a alta do dólar e a queda da Bolsa de Valores de São Paulo -, aconteceu, na opinião de Palocci, pela maneira como as denúncias de Buratti foram divulgadas. “Por isso ressaltei aqui a responsabilidade de todos”.

Ele também descartou a possibilidade de a política fiscal tornar-se ainda mais ortodoxa para isolar a economia da crise. “Não é uma atitude que blinda a economia. São os resultados que levam a fundamentos sólidos. Os fundamentos não carecem de reforço, mas não podem ser enfraquecidos. Isto seria um engano enorme, um engano do tamanho do Brasil”.

Crise, Lula, o PT e o Congresso
O ministro reiterou a disposição do governo Lula de investigar tudo desde o início da crise, com determinações específicas a ele e demais ministros, como Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, e Waldir Pires, da Controladoria-Geral da União. “Muitos dos dados que vocês publicam vêm da PF e do Banco Central”, comentou.

Palocci não acredita que a crise provoque a paralisação do Congresso ou a deterioração das relações com o governo. “Deputados e senadores também têm consciência e responsabilidade. Quando há conflitos, o próprio Congresso resolve. O Congresso é uma casa de conflitos. Temos de respeitar”.


Para o ministro, não há orquestração contra o governo. “Houve um problema real. Parcelas do governo e do partido têm culpa nisso. Mas não foram as instituições, foram as pessoas. Você vê interesses políticos menores tentando interferir na crise. São aproveitadores, apressadinhos, mas não estão prevalecendo”.

Ele acha que o país sairá melhor da crise. “Nunca se explicitou tanto estas questões. As coisas estão mais do que explícitas. Tudo aparecerá a seu tempo. Isso não é um episódio só brasileiro. As grandes democracias às vezes são chacoalhadas por crises dessa natureza e saem fortalecidas, porque são grandes democracias. Não temos de temer eventos como este. Temos de enfrentá-los”.

Palocci também vê com otimismo o futuro do governo Lula. O Brasil (no final de 2006) vai sair muito melhor do que quando o presidente Lula iniciou seu trabalho. Podem comparar os dados. Todos, sem exceção, estão bem melhores do que no passado. O Brasil melhorou. Todos deveriam aplaudir a melhora do Brasil”.

Quando às declarações do secretário-geral do PT, Ricardo Berzoini, de que Palocci deveria prestar esclarecimentos sobre as denúncias, o ministro disse não as considerar ofensivas.
“O Berzoini tem todo o direito de ter a reação que teve. Existe um esforço muito grande da nova direção do PT, que passa por uma situação extremamente difícil. Respeito as posições, não me considero ofendido. Lado bom da posição dele foi não deixar de dizer que, em todos os casos, o PT quer o esclarecimento dos fatos”,