BEPE DAMASCO
Já se passaram 36 dias da sua derrota. E nesse período o senhor não fez outra coisa a não ser dar vazão a um ressentimento doentio, apontando o dedo acusador para quem lhe venceu
Senhor senador,
Posso
avaliar a intensidade da frustração que lhe corrói a alma e embota o
raciocínio. Deve ser mesmo duro perder uma eleição quando se tem ao seu
lado a cobertura parcial, pusilânime e, como no caso da Veja às vésperas
das eleições, criminosa do monopólio midiático brasileiro. O trabalho
dos pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, o chamado
"Manchetômetro", é a prova cabal do linchamento midiático a que foi
submetida a presidenta Dilma e do céu de brigadeiro que foi oferecido ao
senhor pela mídia mais velhaca do planeta.
O
mercado financeiro, os rentistas, aquela turma que "não dá prego em
barra de sabão", também cerrou fileiras junto ao senhor. E cerrou para
valer. Especularam sem pudor, fizeram a bolsa e o dólar subir e descer
ao sabor das pesquisas, repetindo o terrorismo do qual Lula foi vítima
em 2002. Boa parte dos grandes capitalistas brasileiros também o
apoiaram. Tudo isso temperado por um sentimento antipetista, xenófobo,
intolerante, preconceituoso e obscurantista jamais visto neste país.
Nesse cenário, é até compreensível que o senhor acalentasse o sonho de
ser o próximo presidente da República.
No
entanto, como para seu partido o povo não conta, o senhor desprezou as
inúmeras realizações dos governos de Lula e Dilma, as 40 milhões de
pessoas que deixaram a miséria e a pobreza absolutas, o recorde na
criação de empregos, a defesa dos salários, a política de valorização
permanente do salário mínimo, o Minha Casa, Minha Vida, o Ciência sem
Fronteiras, o Prouni, o Pronatec, as obras de infraestrutura, as mais de
um milhão de cisternas construídas no Nordeste, o enfrentamento da
crise econômica internacional preservando as conquistas do povo, a
política externa soberana.
Sua
dor hoje talvez fosse menor se seus marqueteiros e estrategistas
tivessem lhe alertado para o fato de que os movimentos social e sindical
estavam com Dilma e que a juventude das jornadas de junho voltara às
ruas para apoiar a presidenta, temerosa do retrocesso brutal para o país
que uma eventual vitória do senhor representaria. O setor de
inteligência da campanha tucana tinha a obrigação de prever que sua
concorrente usaria com competência o horário eleitoral gratuito no rádio
e na televisão, na prática o único período em que o monopólio da mídia é
quebrado no Brasil, para mostrar suas realizações e dinamitar sua fama
de bom gestor público.
Como,
provavelmente, nada disso aconteceu, o senhor caiu do cavalo no dia 26
de outubro. Vamos combinar que o tombo foi feio mesmo. Mas custava
adotar um comportamento minimamente democrático e republicano depois da
derrota? Além de se revelar um péssimo perdedor, o senhor a cada dia dá
mais razão aos que acham que sua negativa em aceitar a derrota é sintoma
de uma estranha patologia política, em que a derrota sobe à cabeça.
Devemos
admitir, porém, que o senhor conseguiu uma proeza: deixar para trás, no
quesito obscurantismo, o seu correligionário José Serra, também
derrotado em 2010. Muitos chegaram a pensar que o Brasil não veria tão
cedo um candidato lançar mão de táticas e estratégias tão baixas como
Serra. Ledo engano. Quatro anos depois, a falta de compostura política
exibida pelo senhor e o ódio que dispensa a quem cometeu o crime
imperdoável de superá-lo em número de votos, acabou empurrando até o
senador eleito por São Paulo para o time dos que pretendem fazer
oposição republicana ao governo.
Já
se passaram 36 dias da sua derrota. E nesse período o senhor não fez
outra coisa a não ser dar vazão a um ressentimento doentio, apontando o
dedo acusador para quem lhe venceu. Um dia pede ao TSE a recontagem de
votos, no outro acusa o governo de crime de responsabilidade por não
cumprimento de meta fiscal e defende o impeachment de Dilma, o que faz
também ao explorar a Operação Lava Jato. Na mesma linha golpista, pede a
reprovação das contas da presidenta e, infâmia das infâmias, acusa o PT
de ser uma organização criminosa.
Além
de faltar com o respeito com os mais de 54 milhões de eleitores que
votaram na candidata do PT e caluniar os mais de um milhão de filiados
ao partido, seus militantes, dirigentes, vereadores, deputados,
senadores, prefeitos, governadores e a presidenta Dilma, esse tipo de
ataque só aumenta a convicção de que o senhor é um caso perdido para a
nobre causa da convivência democrática. Espero que o PT, conforme
anunciou Rui Falcão, presidente do partido, vá as últimas consequência
no processo criminal que pretende mover. Vamos ver se nos tribunais o
senhor mantém a arrogância e falta de civilidade costumeiras.
Da
minha parte, fico a pensar na sua suprema cara de pau, em como seu
udenismo moralista não resiste a mais banal confrontação com a
realidade. Sua trajetória como político, sua passagem pelo governo de
Minas e os fatos que vieram à tona na campanha eleitoral, nas redes
sociais, e até na imprensa que lhe protege, deixam claro que o senhor,
dono de um gigantesco telhado de vidro, não tem a mínima autoridade
moral para dar lição de ética em quem quer que seja. Nessa toada, porém,
a história lhe fará justiça, reservando-lhe a galeria destinada aos
políticos demagogos, pequenos e mesquinhos. Que assim seja.
Cordialmente,
Bepe Damasco,