"Remeter o processo que corre contra o 
ex-presidente do PSDB a Minas Gerais significaria, na prática, diminuir 
drasticamente o escopo e amplitude dos crimes cometidos – de mensalão 
tucano passaria a ser não mais que mensalão mineiro e, de quebra, tendo 
no horizonte apenas a penumbra que obscurece o sol da justiça – a 
prescrição", diz Daniel Quoist, articulista da Carta Maior
Por Daniel Quoist, da Carta Maior
1.  O deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG) ao 
renunciar de forma solerte ao mandato que ocupa na Câmara Federal, nem 
mesmo se dando ao trabalho de defender pessoalmente a honra que diz ter 
sido tragicamente enxovalhada, deixa evidente que o moveu tão somente o 
desejo duplo de (1) impedir a celeridade de um processo que nunca foi 
célere, ensejando a completa e inequívoca prescrição de praticamente 
todos os crimes pelos quais fora processado e (2) diminuir drasticamente
 os estragos que o andamento do julgamento causarão à campanha de Aécio 
Neves à presidência da República.
2.  A ação 
chegou à corte ainda em 2003, dois anos antes, portanto, das primeiras 
acusações do chamado mensalão do PT, que abalaram o governo petista e 
redundaram na Ação Penal 470. E desde essa época tem dormitado 
longamente nos escaninhos dos ministros.  Enquanto isso, o Supremo já 
condenou 25 réus envolvidos no esquema de desvio de dinheiro montado 
pelo PT e analisa agora os respectivos recursos finais, os embargos 
infrigentes. A única justificativa plausível para o tratamento jurídico 
tão diverso é o filtro político-partidário dos réus indiciados.
3. Curioso
 que ainda em 2003, o então presidente da corte, Carlos Ayres Britto, 
chegou a chamar o julgamento do mensalão tucano de ação cível, aquela 
que permite a recuperação de recursos desviados dos ilícitos penais. Mas
 por algum motivo que nem Ayres Britto nem os demais ministros sabem 
explicar, o processo saiu da pauta. E não voltou mais.
4. O
 esquema de desvio de recursos públicos que abasteceu o caixa de 
campanha de políticos do PSDB em Minas Gerais também era operado pelo 
publicitário Marcos Valério. O mesmo Valério que foi julgado pelo STF 
com as maiores penas atinentes ao mensalão petista: Condenado a 40 anos,
 4 meses e 6 dias e multa de R$ 3 milhões por corrupção ativa, peculato,
 lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha. Seria 
descabido a qualquer observador imparcial entender os motivos que 
levariam o STF a usar de dois pesos e duas medidas: réus petistas são 
julgados diretamente pelo Supremo, perdendo o duplo grau de jurisdiço e 
réus tucanos são julgados diretamente pela Justiça Estadual, ganhando o 
duplo grau de jurisdição e todas as benesses que favorecem os réus nessa
 esfera judicial.                            
5. A
 Justiça de Minas Gerais decretou em 21/1/2014 extinta a punibilidade de
 Walfrido dos Mares Guia, acusado de participar de esquema de desvio de 
dinheiro público em 1998 para a campanha de Eduardo Azeredo (PSDB-MG), 
então candidato à reeleição ao governo do Estado. A juíza Neide da Silva
 Martins, da 9ª Vara Criminal de Belo Horizonte, entendeu que as 
acusações de peculato e formação de quadrilha prescreveram em 2012, 
quando Mares Guia completou 70 anos.
6.  Pela 
lei, quando o réu completa 70 anos, o prazo para a prescrição dos crimes
 – de 16 anos entre a ocorrência do fato e a aceitação da denúncia – cai
 pela metade. No caso do mensalão mineiro foram 12 anos entre os fatos 
(1998) e o acolhimento da acusação formal (2010). Em abril, Cláudio 
Mourão, tesoureiro da campanha do PSDB ao governo de Minas em 1998, 
também vai completar 70 anos e poderá requerer a prescrição dos mesmos 
crimes.
7.  O PSDB, partido beneficiado 
diretamente com as falcatruas protagonizadas ao longo do mensalão 
tucano, nunca se eximiu de tripudiar em cima de José Dirceu, 
ex-presidente do PT, seu adversário figadal, condenado pelo mensalão 
petista. E sempre desconsiderou por completo a possibilidade mais dias 
menos dias ter seu próprio ex-presidente do PSDB amargando a mesmíssima 
condenação no STF.
8.  Se o STF decidir acatar o
 requerimento da defesa de Eduardo Azeredo para que o processo do 
mensalão mineiro deixe interrompa sua tramitação no Supremo, que teve 
início dem primórdios de 2003, e comece agora, em 2014, a tramitar na 
Justiça de Minas Gerais a possibilidade de que todos os crimes 
prescrevam são imensas. E isso porque é patente e escancarada a contumaz
 blindagem que os malfeitos tucanos recebem nas instâncias das Minas 
Gerais, seja a blindagem feita com apuro pela imprensa mineira (nenhuma 
notícia que deslustre a imagem de Aécio Neves ocupa primeiras páginas, 
intermediárias páginas ou mesmo páginas finais de seus jornais e 
tabloides) seja a blindagem tucana no judiciário mineiro (desde 2003 
nenhum mísero processo prosperou em que sejam acusado de falcatruas 
proceres tucanos).
9.  Mesmo ministros que 
tenham anteriormente defendido que processos com as características dos 
chamados mensalões petista e tucano deveriam ser desmembrados, 
permanecendo no Supremo apenas aqueles réus com direito a “foro 
privilegiado” (caso de parlamentares no exercício do mandato por 
exemplo), estariam incorrendo em grave equívoco ao fazer retroceder 
qualquer entendimento divergente acerca da matéria e deixando de aplicar
 o entendimento vigente a casos que já estejam em tramitação no Supremo.
10. 
 Considerando as peculiaridades, idiossincrasias, teorias controvertidas
 como o “dominío de fato”, excessivo gosto por exposição midiática 
protagonizado por ministros do Supremo, como o atual presidente Joaquim 
Barbosa e seus ex-presidentetes Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello, 
debates acerbos e eivado de insinuações pouco airosas, destemperos 
verbais e emocionais os mais variados transmitidos exaustivamente pela 
TV Justiça ao longo de 2013 para todo o país quando do julgamento da 
AP-470, soaria insustentável qualquer tentativa de considerar justo o 
julgamento do mensalão petista se colocado como contraponto a falta de 
zelo pelo Supremo com a administração da justiça para os réus no 
processo do mensalão tucano.
Remeter o processo que corre contra
 o ex-presidente do PSDB a Minas Gerais significaria, na prática, 
diminuir drasticamente o escopo e amplitude dos crimes cometidos – de 
mensalão tucano passaria a ser não mais que mensalão mineiro e, de 
quebra, tendo no horizonte apenas a penumbra que obscurece o sol da 
justiça – a prescrição.
 
 
