12 novembro 2014

Dilma disse que Dilma seria mais Dilma. Qual a dúvida?

Ichiro Guerra:
Em campanha, presidente prometeu 'governo novo, ideias novas'; também disse que Dilma Rousseff iria ser "mais Dilma" no exercício do cargo; ficou claro que ela buscaria alternativas a escolhas do primeiro mandato; e que usaria sua própria intuição para resolver problemas e conflitos; decisão sobre novo ministério dentro de seu próprio tempo, sem conciliar com pressões de apoiadores e adversários, segue à risca o que ela mesma adiantou - e não rompe proposta diálogo; não entende quem não quer


247 – A presidente Dilma Rousseff está fazendo exatamente o que disse que faria. Na campanha eleitoral, o slogan principal da candidatura dela foi 'governo novo, ideias novas'. Nos bastidores, a presidente avisou que, reeleita, 'Dilma seria mais Dilma' no exercício do segundo mandato. Só não está entendendo os movimentos da presidente quem não quer entender. Afinal, ele foram adiantados por ela mesma. Outra coisa é não terem gostado do que ouviram, mas que foi falado, isso foi.
De início, uma questão bastante pontual: Dilma não quer encerrar mais cedo seu primeiro mandato. Ela não está obtendo, nem de aliados e muito menos de adversários, a trégua de praxe para poder organizar a nova etapa da administração. Enquanto nos Estados Unidos até a mídia, considerada a mais avançada do planeta, concede 100 dias contados de ausência de críticas a um presidente eleito, por aqui o que se tem são ataques minuto a minuto até mesmo à legitimidade da vitória da presidente. Foram 3,5 milhões de votos a mais, mas, na crítica do PSDB e na decupagem dos resultados oficiais feitas por alguns jornais, parece que todos saíram da região Nordeste e deveriam valer menos de 1.
Melhor do que renegar a soma dos sufrágios seria fazer proposta de mudar o sistema eleitoral, para atribuir ponderação sobre o eleitorado de cada Estado, como acontece, para repetir o exemplo, nos Estados Unidos com seu sistema indireto de eleição presidencial. Importante: no segundo turno, por mais de uma vez, Dilma lembrou que, no Brasil, cada pessoa vale um voto – e era por isso que ela acreditava na vitória. Só não ouviu quem não quis.
PRIMEIRO MANDATO ACABA EM 31 DE DEZEMBRO - Interessada em não encerrar antes da hora determinada o seu primeiro governo, que vai até o dia 31 de dezembro, a presidente demarcou em duas entrevistas logo após sua vitória, nas emissoras Record e Globo, que anunciaria seus novos ministros na segunda quinzena de novembro. "Depois da reunião do G20", demarcou. De novo, quem não entendeu a informação oficial, dada da boca da presidente, só pode ter sido por que não quis.
Aliados, sob o conforto da vitória, e adversários, na trincheira fria da oposição, têm cobrado de Dilma pressa na definição dos nomes de seu novo ministério. Pode-se cobrar, mas querer, nestas circunstâncias, que a presidente faça o que se quer é um tanto de arrogância. Afinal, ela não mandou recado, mas avisou que tomaria seu tempo para fazer as mudanças na equipe. Caso a promessa tivesse sido diferente, algo como "agora que ganhei, vou fazer tudo o que meus apoiadores e a oposição me mandarem fazer", a frustração seria compreensível. Mas Dilma não enganou ninguém, deixou claro, ao contrário, as suas datas. Por que o espanto?
Enquanto Dilma governa ao seu estilo, como ela mesma disse que faria, não se tem notícia de que o mundo ou o Brasil tenham acabado. Ao contrário, na economia nacional o que se vê são indicadores absolutamente naturais, como a redução da taxa de inflação em outubro sobre setembro, um leve aumento na produção industrial e a manutenção nas taxas de emprego.
Neste quadro, Dilma deixou vazar que estuda alguns nomes para o lugar de Guido Mantega no Ministério da Fazenda. Estão entre eles o do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles e o do ex-secretário executivo da Fazenda Nelson Barbosa, mas não será mais surpresa se Alexandre Tombini, presidente do BC, assumir o posto. Outra alternativa igualmente poderá ser efetivada. Pode-se gostar ou não da escolha a ser divulgada, mas que foi mesmo que obteve o direito de fazê-la? A pessoa que teve seu nome mais teclado nas urnas eletrônicas tanto no primeiro, como no segundo turno, de iniciais D.R., número 13 na tela.
O PT, 13, não apenas pode como deve, por ser o partido da presidente, fazer as suas pressões por cargos e nomes. A oposição, mesmo sob o risco de animar projetos antidemocráticos, tem o papel do ataque. Mas não é função de Dilma ceder nem a um nem à outra. Lembre-se: ela anunciou que Dilma seria mais Dilma a partir de agora.
Mesmo legítimas, as tentativas de pressionar a presidente mais se parecem com iniciativas para sequestrar o mandato conseguido por Dilma Rousseff – um novo período de quatro anos na Presidência que, de resto, nem começou.
DIALOGAR NÃO É CEDER - Dilma também prometeu, isso é fato, ouvir mais e dialogar mais com as forças políticas e a sociedade. De modo institucional, tem recebido lideranças e partidos, reunindo informações para fazer suas reflexões. Dialogar não significa, necessariamente, fazer o que o outro queira. Se fosse assim, Dilma também poderia exigir que, em lugar dela, seus interlocutores entendessem suas posições e cedessem eles mesmo. Por que o que se deseja é que apenas ela dê o passo atrás?
Na campanha, Dilma chegou a ser ironizada por ter anunciado que o ministro Mantega deixaria o cargo no segundo governo, em respeito à promessa de 'governo novo, ideias novas'. Foi ironizada em diferentes setores da mídia tradicional. No PSDB acreditou-se que ali estava um erro crucial, e logo o candidato Aécio Neves anunciou o ex-presidente do BC Armínio Fraga como seu futuro ministro da Fazenda. O que os eleitores acharam das duas estratégias ficou-se sabendo no dia 26 de outubro. Será que Dilma precisa mesmo dizer a todos que a presidente atual e futura, por delegação popular, é ela?